terça-feira, 14 de janeiro de 2014

O Compasso e o Caminho da Forja



O Bruxo sempre esteve comprometido com o seu caminho e este, marca a roda do compasso numa estrada sinuosa e virtuosa por onde muitos chamam de caminho da transformação, não menos dolorosa, onde aquilo que ainda é pedra bruta, vira uma joia preciosa.

Andrew Chumbley afirmava que a magia é a transformação da quintessência do ser, e eu concordo com ele, desde que é lá no nosso mais profundo íntimo que reside o poder real e o real poder.


O dom de mudar a si mesmo está verticalmente ligado à sinceridade mais pura, divina e sem autocondescendência, e esse dom é transmitido via iniciação para durante o processo de desenvolvimento com trabalho interno de Covine, onde o Acre se torna Círculo e a roda marca a bússola do Compasso. Ninguém pode dar para si mesmo aquilo que não tem, e é por esta razão que durante a forja de Vulcanus, ou de Tubal Caim, as mudanças ocorrem e com elas nosso caráter se justifica e muda junto, afinal trata-se da linhagem bruxa recebida de nossos iniciadores. Por isso, em tempos que resolvem os equilíbrios e o balanço natural das coisas, seremos sempre o vilão de um herói e o herói de um vilão, isso nos amadurece.

Ao longo desse tempo vamos trocando de pele, mudando de opinião, de postura, de consciência, expandindo-a inclusive, e convidamos para nós mesmos uma série de transgressões e obstáculos a serem também transportados para o Caminho das lições, onde aprendemos que nada permanece para sempre como estava antes, e assim é preciso ter mais coragem para tomar um ato pacífico de acordo com os princípios da indulgência e da piedade, ao invés de exaltar o ego em falsa vitória.

A transformação interna é mais importante para um mago ou bruxo, do que a exaltação dos poucos minutos de glória passageira. A banda de moebios revela o símbolo do infinito e nele consta uma eternidade de vitórias perenes. O mundo está cheio de gente corrupta que só vislumbra o poder, o dinheiro e a superfície de uma superioridade em Maia (ilusão), já que cegos não podem trabalhar como guardas de trânsito, mas podem soprar o apito e apontar o dedo para indicar uma direção onde não se vê para onde está indo, este então, não pode guiar pessoas, mas pode guiar outros cegos, enquanto o verdadeiro compromissado com o seu caminho poderá sempre guiar pessoas para a liberdade, desde que ele já pode guiar a si mesmo. 

Os ensinamentos adquiridos com o Compasso traçam um caminho completo para a transformação pessoal e para a realização espiritual. Este caminho inclui uma compreensão profunda da negatividade pessoal, no qual chamamos Diabo, suas origens, consequências, e um processo para situá-la e transformá-la. Esse processo não se adquire em nenhum curso ou universidade, mas dentro de um Covine Tradicional, que é a melhor escola e não tem semelhante em nenhum outro tempo ou lugar.

O trabalho mágico é aquele que você faz com você ao permitir-se aprender com seus iniciadores, por intermédio deles terá por objetivo possibilitar nossa auto realização pela transformação, concretizar nosso potencial humano individual para a execução de uma tarefa significativa no mundo e para o desenvolvimento de relações afetuosas com os outros. Nesse ponto, nos vemos como deuses vivenciando uma experiência humana, e justamente por isso, por ela limitada em sua condição física.

A partir desse ponto, nunca antes o sabá das bruxas ganhou mais importância e necessidade, tanto o sabá terrestre, o infernal e o celestial, já que é nessa condição que a bruxa se desdobra entre os mundos na forma do seu animal poderoso e transcende os limites da carne.

Essa prática espiritual tem por objetivo alcançar sua hóstia com aquele à quem muitos chamam de Diabo e seus ancestrais, uma verdadeira iluminação, pois como em Platão, é a partir das trevas que se pode ver a Luz, ninguém chega verdadeiramente até Deus sem passar antes pelo Diabo, e é por isso que ele é encontrado nas encruzilhadas das bruxas e fora dela, para assim, haver uma fusão com a consciência unitiva, nossa unidade com todas as coisas.

A meta principal de um trabalho espiritual é conhecer a nossa identidade e limitação mais profunda, com a sombra, como seres inspirados pelos deuses, plenos de amor e de luz. Para tal, Lúcifer, o portador da luz, precisa antes ser compreendido, uma vez que ele não é um ser, mas sim, nossa luz interna, o que nos torna a nós mesmos como os portadores da luz.
O Caminho completo deve orientar-nos, quer quanto às frustrações que nos detém na realização e cumprimento de nosso destino, quer quanto às limitações que impedem nosso despertar.

Um grande sábio disse uma vez que nós somos guiados pelas estrelas, mas infeliz daquele que se deixa ser guiado por elas. O mesmo é válido para todo e quaisquer oráculos ou mancias, desde o tarô até o I-Ching. A bruxa faz suas escolhas e exercendo seu livre arbítrio ela faz o seu caminho, independente da orientação dada pelas mancias, chegando até mesmo manipular situações e pessoas em seu favor. Então, não se engane, pois um bruxo está exatamente aonde ele quer estar, ainda que as aparências enganem e lhe force a crer que há uma derrota aparente.

Ainda há pessoas que se perguntam: “Como posso ir de onde estou para onde quero estar?”

Se for uma bruxa, ela saberá exatamente transpassar de uma margem à outra, uma vez que somos nós que criamos nossa própria realidade, sem vergonha nem medo, e seguindo atentos e ocupados com a questão do autoconhecimento que nunca acaba, onde a pergunta não é relativa à transposição de lugares, mas sim com que parte de mim eu crio situações que reputo totalmente desagradáveis à mim e aos outros? Não dá pra agradar “gregos e troianos”, alguém, durante suas escolhas, sempre irá emanar emoção ou sentimento adequado ao que cavalga e à situação que é sofrida e ocasionada pela escolha feita.

Algumas pessoas se perguntam: Por que meu trabalho de criação não dá origem à vida que acredito querer? Por que é tão difícil mudar alguns aspectos meus? Por que mudo de residência ou de país e sempre continuo na mesma vida dependente de artifícios financeiros sem autossuficiência?

A resposta é uma contribuição honesta de passarmos de onde estamos para onde queremos estar. Durante conflitos não há mudanças, apesar de elas ocorrerem tempos depois que os conflitos cessam. É necessário lembrar que nossos mestres descrevem o estado iluminado como uma fusão no amor em harmonia, onde a pessoa se sente unida a todos como numa rede ou teia universal e abundante, e se entrega alegremente à divindade, tornando-se UNO com ela.

Se você é honesto consigo, porém sabe que não consegue atingir suas metas, necessita de algo que te leve a aceitar-se totalmente como você é agora, no hoje, e que te oriente a trabalhar com o que bloqueia sua evolução que deveria conter progresso pessoal e espiritual. É preciso consultar seu mapa interno sem idealizar nem pratear vossas deficiências humanas.

O Caminho elabora um mapa consciente que inclui nossos demônios e anjos, a criança vulnerável e o adulto competente, os interesses mesquinhos do ego e também os anseios visionários sublimes. Muitos ainda guerreiam consigo mesmos, mas como não pode domar a si mesmo, acaba elegendo alguém para representar seu ganho pessoal, sua vitória, humilhando e subindo na vida a custas das desgraças alheias. Isso não é virtuoso, pois essas pessoas não enxergam que ao humilhar o próximo em público ou não, estão se auto derrotando, enquanto que aquele que permite a humilhação está se elevando conscientemente de forma sublime e sacrificial. Muitas vezes ganhamos perdendo e perdemos enquanto ganhamos. Perdeu-se no caminho aquele que exalta o ego para se projetar tirando vantagem de algo ou alguém, que se aproveita da aparente fraqueza alheia. Digo aparente fraqueza porque não há fraqueza verdadeiramente, muitas vezes temos de escolher conscientemente deixar o outro se elevar para que possamos nos elevar junto, mesmo que em níveis diferentes de expansão mental ou espiritual. O ser humano venceu os dinossauros. O ser humano é o único que pode se autodestruir.



Lembre-se, hoje você não pode mais pensar igualmente como ontem. Aprenda com os erros próprios e com os dos outros.

Em todo processo iniciático, há o aprendizado que nos orienta e nos ampara à medida que nossos passos nos levam da pessoa que somos agora para a pessoa que nos tornaremos, mais elevadas, mais realizadas, mais felizes, e mais conscientes que podemos ser. Não se pode fingir que somos uma imagem idealizada de nós mesmos, a pessoa que pensamos que deveríamos ser. Nossa bússola nos ajuda a aquietar-nos na aceitação da maneira que honestamente somos e do que sentimos, momento a momento, dia a dia, noite por noite, mês a mês, ano a ano.



Se você for autêntico consigo mesmo, poderá descobrir dentro de si sentimentos e atitudes desagradáveis e egocêntricas. Apesar disso, não se sentirá uma pessoa má, não é mesmo?

Mas por que é tão difícil amar a si mesmo e amar os outros como ama a si mesmo?

A pergunta deveria complementar: Por que continuo a ser tão egocêntrico ou autodepreciativo?



A maioria das religiões ou sistemas mágicos nos dão bem pouca ajuda efetiva nessas questões, porque prescrevem mandamentos morais, rígidos códigos de condutas éticas que as vezes mais escravizam do que libertam, dogmas obcecados pelo poder de mando e controle, recheados por culpa e medo, ameaças ou persuasão, e dessa forma não fazemos emergir a nossa negatividade. Quando falhamos, somos admoestados a tentar com mais empenho. Somos forçados a oferecer as nossas imperfeições à outra pessoa, seja um avatar religioso ou um representante de fé, um guru, uma igreja, ou então espera-se que nos elevemos acima de nossas limitações e que consideremos nossa negatividade como ignorância meramente temporária de nossa divindade. Se pararmos para pensar que Deus é infinitamente grande, se torna impossível você pecar contra ele. Só nesse pensamento já caem por terra todos os dogmas de controle, então você se liberta e aprende a pensar com sua divindade interna, que é uma célula ou expressão da Rede Divina onde todos nós somos UNO.



Como poderemos reconhecer nossa negatividade sem dourá-la e sem ser por ela destruídos?

Descarregamos nossas culpas e emoções deprimentes, nossos sentimentos maus sobre os que achamos que nos magoaram e esperamos que os pensamentos ruins ou negativas emoções se dispersarão, mas isso não acontece. Na verdade isso se torna um vício e um padrão repetitivo, onde você acabará elegendo um inimigo fora de você, quando deveria olhar pra si como seu próprio inimigo, para que se nasça a amizade e a união, a aceitação e a entrega. Se você foi sincero agora ao reconhecer isso, já é um grande avanço para se tornar um bruxo de verdade. O caminho do perdão leva ao amor e o da piedade enobrece e exalta suas virtudes mais douradas.



O único sentimento verdadeiro é o amor, todo o resto é apenas emoção criada pela sua mente, e a entrega de si somente acontece com o amor perfeito e a confiança perfeita.

Nós nascemos imperfeitos ou não haveria razão de passarmos o resto da vida buscando sermos melhores, para que possamos oferecer o que temos de melhor, e ontem eu me achava melhor, mas hoje estou melhor que ontem e amanhã estarei ainda mais. Portanto, se você acha que ganhou uma guerra ou uma batalha, na verdade você se perdeu do verdadeiro propósito da sua existência e do seu destino, e no amanhã você reconhecerá que foi um tolo ontem, porque hoje você se aperfeiçoou um pouco mais do que você era ontem, então ontem você ainda era imperfeito.



Sem ser sincero consigo mesmo em tudo que foi dito acima, você não pode se considerar um ser desperto ou consciente de fato.

Nós carregamos uma sacola de virtudes pendurada no pescoço e sobreposta em nosso peito, e uma outra sacola de vícios igualmente pendurada no pescoço e sobreposta nas costas.

A evolução de nossa sombra, no amor e com amor, é transformação que se dá em fila, uma atrás da outra. À medida que vamos crescendo, o eu reprimido transforma-se num saco amortecedor que pode ser chamado de “a sacola que arrastamos atrás de nós", que contém as nossas porções inaceitáveis. Há uma ligação entre as nossas sacolas pessoais e outros tipos de sacolas: as sombras coletivas, e dessa forma, quem está atrás de você nessa fila só irá enxergar a sacola que o indivíduo da frente carrega nas costas dele.



Para ver a luz, é preciso estar nas trevas, e quando você se tornar luz, será lançado nas trevas novamente porque é lá que se pode brilhar. Se tudo fosse luz seríamos cegos e se tudo fosse trevas seríamos cegos igualmente. Para ser bom, é preciso conhecer o mau, para ser perfeito é preciso conhecer a imperfeição, para ser Deus é preciso aprender com o Diabo, e por último, se situar nem dentro nem fora, mas acima da briga ética entre o bem e o mau, verdadeiramente consciente de quem se é, em qual direção sua bússola apontará, para onde seu destino tornará, qual é seu papel no mundo e no entre mundos, quais caminhos seu compasso mensurará, e quando alguém pedir para apagar uma página da vida, se lembre que esse alguém está rezando, a ti que é um deus na Terra, e um deus sempre pode conceder a realização desse pedido, porque ele simplesmente pode!



A linhagem é sempre preferível a um diploma, porque quem não sabe de onde veio, não sabe para onde vai!

Marsílio Ficino afirmou: "A alma pode ser chamada o centro da natureza, a intermediária de todas as coisas, a corrente do mundo, a essência de tudo, o nó e a união do mundo. Conhece-te a ti mesmo, ó linhagem divina vestida com trajes mortais!"


Por isso, bruxos são pessoas que vão doar à você, aquilo que você trouxer pra fora, de dentro pra fora!

Sett Ben Qayin



sábado, 11 de janeiro de 2014

As Fadas Romanas


Fates

Entende-se por religião romana o conjunto de crenças, práticas e instituições religiosas dos romanos no período situado entre o século VIII a.C. e o começo do século IV da era cristã. Porém há muita confusão quando se fala sobre fadas no ‘mundo romano’.

Em primeiro lugar, devermos compreender que fada não é um conceito celta por absolutismo, mas a compreensão de que fadas não são mulheres com asas de borboletas é entendimento comum entre inúmeros bruxos, os quais as veem como são, ou seja, o povo de Elphame, os mortos - ancestrais por linhagem sanguínea e/ou mítica, inclusive.

Então, vamos dar uma olhada no que os autores escreveram sobre isso?

Schoereder diz que o nome fada vem do latim fatum, que significa fado, destino. Apesar disso, há uma tendência em meio a alguns pesquisadores que querem fazer parecer a palavra fada oriunda do termo Pher usado por Homero para indicar os centauros mitológicos. Fato é que em 1599 a Inglaterra teria feito alçar voo às estórias de fadas com os contos dos anéis de fadas, uma alusão aos cogumelos amanita muscária, os quais são enteógenos usados nos trabalhos de transe de algumas bruxas oraculares que intermediavam os reinos (dos vivos e dos mortos) para cuidar do que poderia vir acontecer.

O feitiço sendo uma palavra que os portugueses levaram para a África e de lá voltou com os franceses como fetiche, tem sua origem no latim romano facturus, (ação sobre o futuro), a mesma ordem de palavras que designam “feiticeiras”, ou facticius, de Fatus, fado, diferente de Fortuna, mas não de Sors (sorte/destino), diferenciando da palavra Saga-ãe (bruxas que nasceram em Roma), porém tinham suas companheiras de equilíbrio, as Fúrias Dirae, fadas infernais tomadas como demônios por alguns autores, as quais desequilibravam as emoções de quem não podia suportar o seu destino ou controlar a si próprio.

Como sabemos, o sânscrito gerou o latim e podemos encontrar significados reveladores entre essas duas línguas, assim como Aca Larência, onde Acca é um termo onomatopaico da linguagem infantil para designar “mamãe”, como o sânscrito akkã.

Larentia é um derivado de Lar, Laris, e no plural: Lares, -um, -ium, “espíritos tutelares”, tido como alma dos mortos, familiares ou públicos, encarregados de proteger as famílias, as casas, as ruas e as cidades. O mistério que envolve Larentia e a deusa Lupa (a Loba), está no fato de ter se tornado nome próprio e passou a designar a esposa do pastor Fástulo, como mãe de criação de Rômulo e Remo. Deu à luz doze filhos, com os quais fazia, de contínuo, sacrifícios para a fertilidade dos campos. Com o falecimento de um deles, Rômulo ocupou-lhe o posto e fundou o colégio dos 12 Irmãos Arvais.

Ovídio fala em seu Fast sobre Accalia ou Larentalia, que mais tarde passou a ser conhecida como Lupercália. Uma outra variante dessa história nos foi contada que foi habilmente construída, intencionalmente para que os romanos se apossassem de vastos latifúndios, há muito reivindicados pelo Estado, que diz no reino de Rômulo, tido as vezes como Anco Márcio, durante uma festa, o sacerdote que guardava o templo de Hércules desafiou o herói para um jogo de dados (o mesmo que mais tarde veio tomar lugar nos ossos de Astragalomancia), estabelecendo-se que o vencido ofereceria ao parceiro um jantar e a mulher mais bela, sensual e elegante de Roma. Derrotado pelo filho de Alcmena, o sacerdote cumpriu ambas as promessas: além de um lauto banquete, entregou ao herói a jovem Aca Larência, lindíssima cortesã romana. Ao deixá-la, para retomar os seus trabalhos, Hércules aconselhou-a a entregar-se ao primeiro homem que encontrasse. Aca assim o fez, casando-se logo depois com o varão que o fado lhe destinara pelos lábios de seu ex-amante.

Tratava-se de Tarúcio, riquíssimo cidadão etrusco, proprietário das melhores glebas que circundavam Roma. Morto prematuramente o marido, Aca, antes de falecer, legou todos os seus bens ao povo romano. Depois de muito idosa, Aca desapareceu misteriosamente, bem perto do Velabro (mercado de azeite e comestíveis), junto ao túmulo, onde repousava a esposa do pastor Fáustulo. À ela passou-se oferecer louros no fogo da lareira pública, e posteriormente na lareira doméstica, assim, aos poucos ela se fundiu (ou confundiu) com Vesta, a Dama da Lareira espiritual, ao lado de Mania como senhora do Fogo da Lareira dos Lares, a qual Ernout-Meillet incansavelmente decifrou e definiu o significado pelo sânscrito Vásati (reside permanente), e dessa forma ela foi aproximada da grega Héstia e designou Lareira para sempre devido o Arcádio Wistías. Tal tema foi muito prolixo em H. Frisk, Griechisches Etymologisches Wörterbuch e nos dicionários míticos religiosos da mitologia grega e da mitologia romana em que se segue a hipótese de P. Chantraine, para efeito de referências.

Fado no sentido absolutista, é um tipo de sentença das Parcas, é um conceito moderno para uma decisão sentencial e teve como destino o seu cumprimento, sendo um destino que não se controla, apesar de se poder mudar parte dele em decorrência de certas defesas, esse conceito foi introduzido no mundo do Direito romano e é ainda hoje estudado nas faculdades de Direito e ciências jurídicas. Nesse conceito moderno as Parcas dão sentenças punidoras, mas originalmente as Parcas não tinham essa função, entretanto vou deixar pra explanar isso mais em baixo.

Fortuna é o feminino substantivado e depois divinizado de um adjetivo fortunus (ver origem de Fors) e assim, a deusa que podia ser secunda, prospera, aduversa (boa ou má), opondo-se à razão (ratio) e ao controle foi equiparada à grega Týkhe que significa “conseguir por sorte ao acaso”, Fortuna ficou confundida com Fado, devido a má interpretação do Acaso, e Fortuna passou ser aquilo que o homem consegue, alcança, realiza por decisão dos deuses. Aqui Fortuna dá sentença boa e favorável, nada punidora. Fortuna passou a ser “o piloto da vida dos mortais” para uma boa vida, e seu culto foi trazido para Roma por Sérvio Túlio, o qual tem uma história bem interessante com a deusa, contudo, ela tomou vários epítetos como Fortuna Redux, Fortuna Publica, Fortuna Huiusce, longe daquele último.

Há quem diga que Fors Bona se tornou Fortuna, porém, Fors em princípio era o Acaso, e enquanto nome comum foi usado no nominativo singular fors e no ablativo forte, os outros casos foram dados à Fortuna. Como nome próprio, acoplado a Fortuna, Fors Fortuna emprega-se em todos os casos do singular. Fors provém do antigo fortis, como apareceu na comédia de Terêncio, Phorm., 136-137. Fors se tornou o princípio masculino de Sorte (boa ou má), formando com Fortuna um par, uma dupla que se integra e se complementa. O macho e a fêmea se conjugam na fórmula Fors Fortuna, que se fecham numa sizígia, para designar uma única divindade andrógena e completa.

Fadas de William Blake - Hécate ou as três Fates

Sobre a Sibila, Frisk reuniu a melhor etimologia, sendo que as de Carnoy não são aceitáveis. Heráclito (séc. VI a.C.) fr. 92 Diels, foi o primeiro a se referir à Sibila, “atribuindo-lhe inspiração divina”. 

O fragmento em apreço chegou até nós graças à Plutarco, De Pyth. Or., 6, 397ª, e a tradução que segue é da lavra de Carlos Alberto Louro Fonseca (Os Filósofos Pré-Socráticos, Lisboa, Calouste Gulbenkian, 1982, p. 215): “A Sibila, que, segundo Heráclito, profere, com a boca possessa, palavras sombrias, sem adornos e sem perfume, atinge com a sua voz mil anos, graças ao deus Febo”, Sibila foi confundida com Pítia e foi assimilada com sentido igual. Em Cumana, cidade de Cumas, no sul da Italia, e Tiburtina, de Tíbur, cidade vizinha de Roma, haviam seus oráculos entre outros lugares, não vou evidenciar as coisas gregas aqui, só as romanas, porém farei algumas menções. A primeira Pitonisa, consoantemente, foi uma jovem cujo nome era Sibila, filha do troiano Dárdano e de Neso, filha de Teucro, fundador da dinastia de Ílion. Com o respaldo de Apolo, deus eminentemente troiano, Sibila adquiriu tão grande reputação na arte mântica, que todas as demais profetisas adotaram-lhe o nome.

Voltando as Parcas, no plural Parcae, provém do verbo ‘parere’, presente pario, de parir, mas no sentido de “gerar, dar à luz, pôr no mundo”, contudo, o sentido primitivo era o de “produzir”, como se expressou Catão, em De Re Rust., 89,1. Todavia, segundo Ernout-Meillet, o sentido de “pôr no mundo” não possui expressão conhecida no indo-europeu. Gignere e nasci, “engendrar”, gerar e nascer, vir ao mundo, têm uma acepção social e jurídica e não física. O significado geral em parens, -ntis, que se aplica tanto ao pai quanto à mãe, mostra que o sentido inicial de parere não era “o parto através da mãe”, mas o de “produzir”, como revela o grego tekeîn. As Parcas eram, pois, em princípio, tradicionalmente as divindades que “produziam”, provocavam o nascimento e depois também o casamento e a morte, eram essas suas funções. Não dirigiam acontecimentos por destino, nem os rumos deste, bem como não tinham poder sobre qualquer outro rito de passagem (ou a passagem propriamente dita, além das que foi citada como função), que ocorria na vida de alguém.

Na religião romana, as Parcas, com seus nomes de Nona, Decuma e Morta, (Nona, Décima e Morte), eram as promotoras ou paraninfas do nascimento, casamento e morte. Como o ano era lunar e a religião romana era essencialmente preventiva, as duas primeiras presidiam, de início, o nascimento, pois a criança nascia no décimo mês, daí o temo Décuma, mas como poderia vir um mês antes, Nona então atribuía suas habilidades para assistir a parturiente. Com o tempo Décuma passou a reger um novo nascimento chamado: casamento, e Morta, que possui a mesma raiz etimológica de Moira, com influência de mors, continuou a presidir a morte e dando descanso para as almas. Essa última era um espírito que trabalhava para a morte, não era a morte propriamente dita. 

Com o tempo mais adiante, tomou influência grega e as Parcas identificaram-se com as Queres helênicas, Cloto, Laquésis e Átropos, projeções ou emanações da Moira, as executoras do que foi por esta determinado. Moira era grega, e era a sentenciadora do destino e assim os povos converteram as Parcas em fiandeiras da vida e da morte, lidando com o fio que desenrolava, escolhiam para quem dar o fio e quando cortariam o fio. Não é em vão que se encontra, por vezes, em latim, Parca no singular como sinônimo de Moira, Destino, segundo se pode ver em Horácio, Od., 2, 16, 37-40. No Fórum, as Parcas foram posteriormente representadas por três estátuas comumente denominadas por As Três Fadas, Tria Fata, sob conotações gregas das Moiras, foram tomadas por: os Três Destinos e assim, fada se confundiu com destino na era moderna.

As fadas foram concebidas pelo povo celta de acordo com a visão de mundo que o povo do norte tinha, ou seja, juntamente com a lenda dos Tuatha de Danan que foram morar debaixo da terra, isso, para eles, era melhor que dizer “eles morreram”. Quando os romanos conquistaram o mundo celta, tomaram contato com suas lendas, mitos e religiosidade, assim, conheceram o que os celtas pensavam sobre as fadas e como elas eram vistas e representadas, como espíritos ancestrais que cuidavam do destino da pessoa, da família, e do clã, condado, ou “cidade”.

No mundo romano a acepção de ‘fadas’ foi entrelaçada com a Moira grega, assim como aconteceu com as Parcas, senão vejamos:

Fatus veio depois de Moira e é correto o sincretismo entre Fado e Moira, mas é incorreto sincretizar Moira com Parcas. Fatum, personificado e divinizado com o sentido de “Destino”, fez jus na língua popular a um masculino Fatus e até a um feminino Fata, que nas línguas românicas se perpetuou com a acepção de “fada”. Isso tudo segundo Junito de Souza Brandão, o Dr. Eduardo Nélson Corrêa de Azevedo e Heraldo José Abreu Leitão, bem como o apoio que Lúcia Helena Rios Seabra deu a todos, entre outros catedráticos e autores.

Fatum, Fado, o Destino, é da mesma família etimológica que o verbo fari, “contar, predizer, profetizar”, é a revelação da sorte, onde sorte quer dizer destino, como já observava Varrão, L. 1. 6, 52: Ab hoc (SC. Fari) tempora quod Tum pueris constituunt Parcae fando, dictum fatum et res fatales, ou seja, porque as Parcas predizem, em falando, o tempo de vida das crianças, que o destino e o tempo fixado pelo Destino, o dia fatal, derivam seu nome. Fatal está para morte, Fata está para morte, Fada está para morte. O fado seria assim uma anunciação divina. Diz-se que, a Fada fala sobre Fado, ou, o Morto fala da sorte/destino.

Fata Morgana by Manuela Cuccu

O grego possui um presente correspondente a fatur, “ele diz, prediz”, no dórico phamí, ático-jônico phemí, “eu manifesto, torno visível, digo”. Disso originou-se a Fama.

A raiz encontra-se igualmente no inglês antigo boian, “vamgloriar-se”, armêmio bay, “diz ele”, eslavo antigo baliji, “bruxo, feiticeiro”, donde “médico” é correto.

Fatum, o Fado, o destino, mais empregado no plural fata, -orum, (só na Eneida o plural é usado centro e quatro vezes contra quinze) tem por correspondente semântico em grego (heimarméne), “partilha, necessidade”, da mesma família etimológica de Moira, “parte que toca a cada um”, quinhão, destino, herança, já que ambas provém do verbo meíresthai, “receber uma parte, tomar uma parte, partilhar”. Cícero, em Nat. Deaor., 1, 20, 55, assinala o fato> Illa fatalis necessitas quam (heimarménen) dicitis – aquela fatal necessidade a que chamais heimarménen.

Foi com o significado de “falar, predizer”, do verbo fari, que Fado passou a designar a vontade expressa pela “palavra” de um deus.

Com a influência sempre crescente da religião helênica, em que Moira, (Destino cego) se projetou nas três Queres, Cloto, Laquésis e Átropos, o Fado teve como hipóstases as três Parcas, Nona, Décima e Morta, passando até mesmo a designar as Sibilas. Em Roma, junto aos Rostra, “Rostros” (tribuna para os oradores na praça pública, púlpito este ornamentado com “esporões” de navios inimigos), havia três estátuas denominadas Fata, Fados, que representavam as Sibilas.

O masculino Fatus, Fado, mencionado linhas acima, converteu-se com o tempo numa espécie de Gênius, Gênio, simbolizando o destino individual masculino; Fata “Fada”, traduzia por oposição, o destino feminino, “equivalente tardio da Juno primitiva, como acentua Grimal.

Na literatura grega, Iliada, XXI, 82-83; XVI, 440-443; XX 125-128 para citar alguns passos, Zeus se identifica com a Moira, ora parece que até poderia modificá-la, se o quisesse, ora parece a mais temível das divindades paira acima do pai dos deuses e dos homens, como demonstrou o livro de Mitologia Grega, Vol. I. p. 141 sq.

Na literatura latina, o mesmo ocorre. Em Eneida 1, 257-264; 5, 784; 10, 34-35; 6, 376, o problema é exatamente o mesmo. O Fado e Júpiter se alternam e parecem, por vezes, identificar-se, e por último, a inalterabilidade dos Fata é sumariamente decretada, como diz a Sibila a Palinuro, que, insepulto, desejava através de súplicas a Eneias, valido dos deuses, atravessar as águas do Estige, Em., 6, 376:

Desine fata deum flecti sperare precando, ou seja, perde a esperança de dobrar com rogos os fados dos deuses. Ambos, deuses e fatas se confundem numa mesmo personagem, porque são os mesmas, fado e fada são um só deus/deusa igualmente.

Na próxima postagem daremos continuidade à esse assunto, explorando o mundo das Lasas e das Ladas.



Sett Ben Qayin